O Combate do Serrote Preto

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   Croqui da área onde ocorreu o Combate do Serrote Preto

O Combate do Serrote Preto foi como ficou conhecido um episódio em que um forte contingente policial formado por Patrulhas Volantes da Paraíba e de Pernambuco, entrou em luta com o grupo de Lampião, nas proximidades da Cidade de Mata Grande, em Alagoas, no dia 21 de fevereiro de 1925.

    Desse confronto resultaram as mortes de 2 Oficiais e 5 Soldados e mais 7 Soldados feridos da PM da Paraíba. A PM de Pernambuco também teve 4 Soldados mortos e 3 feridos.  Do grupo de Lampião, morreram 3 Cangaceiros.

        Aqui vamos fazer uma síntese desses fatos, sistematizando os acontecimentos em 3 momentos: O contexto dos fatos; As dificuldades no deslocamentos da Tropa, que percorreu cerca de 150 quilômetros a pé; O combate propriamente dito e as providências adotadas pelo Governo da Paraíba.

      É o que passamos a fazer.

  1. O contexto

        Depois da violenta invasão de um grupo de cangaceiros à cidade de Souza, na Paraíba, no dia 27 de junho de 1924, as atividades dos grupos de cangaceiros começaram a se intensificar em todo Estado da Paraíba.  Nessas circunstâncias, quando João Suassuna assumiu o Governo desse Estado (22 de outubro de 1924), buscou formas de fortalecer os combates aos grupos desses facínoras.

     Em todas as Polícias Militares do Nordeste existiam, há muito anos, grupos de policiais que eram destacados para desenvolver diligências destinadas a perseguir os bandos de Cangaceiros. Esses grupos de Policiais, compostos de 10 a 40 homens, eram denominados de Patrulhas Volantes.

    Uma das grandes dificuldades dessas Patrulhas, era o fato de, nessas ações, não poderem ultrapassar os limites dos seus Estados, o que deixava os cangaceiros em muita vantagem.

       Por essa razão, uma das medidas adotadas pelos Governadores da região, ainda em 1924, por proposta de João Suassuna, foi a assinatura de um Convênio que estabelecia que em ações de combate aos cangaceiros, as Volantes poderiam ingressar em outros Estados.

      A partir de então as Patrulhas Volantes, quando em perseguição a grupos de Cangaceiros, poderiam ultrapassar as fronteiras dos seus Estados.

    Na Paraíba, para facilitar a execução dessas atividades foram concentradas tropas em pontos estratégicos do Estados, assim como, no ano seguinte (1925), foi criado um Batalhão, que foi instalado em Patos, cidade polo da região mais afetada pelos ataques dos grupos de cangaceiros.

      Assim, foram reforçados os Destacamentos da Polícia, em Alagoa de Monteiro, atual Monteiro, no cariri paraibano, Conceição, Misericórdia (Atual Itaporanga), Catolé do Rocha, Pombal, Brejo do Cruz, Rio do Peixe e Princesa, áreas por onde transitavam, com certa frequência, os bandos de cangaceiros. Cada um desses locais passou a contar com Destacamentos de 20 a 40 Praças, sob o Comando de Oficias.

     Nos demais Estados foram adotas idênticas providencias, de forma que o combate a esses grupos passou a ser mais intenso.

    Mas, no início de 1925, na Paraíba, não se tinha ideia do destino do grupo de Lampião.

  1. O deslocamento da tropa

           Nas regiões polarizadas por Princesa e Monteiro, o Deputado José Pereira, político de muito prestígio junto ao Poder Executivo, há muitos anos, coordenava as ações das Patrulhas Volantes. A partir de então Zé Pereira passou a se empenhar mais nessa tarefa em razão de Lampião, dias antes, ter atacado e ateado fogo em uma das suas fazendas.

      No dia 30 de janeiro de 1925, Zé Pereira tomou conhecimento, através de uma mensagem emitida pela estação telegráfica de Custódia, um povoado, no   Município de Alagoa de Baixo, atual Sertânia, em Pernambuco, que o Bando de Lampião estava ocupando aquela povoação.  A mensagem era dirigida a toda a rede de Rádio. Era uma forma de S.O.S.

    De imediato, Zé Pereira determinou que uma Volante, composta por 20 Praças, comandada pelo Tenente Francisco Oliveira, se desloca-se àquela localidade com a finalidade de iniciar buscas ao grupo de Lampião.

       Francisco Oliveira era um Oficial Honorário, ou seja, não integrava o quadro efetivo da Polícia Militar, portando, em tese, não tinha a habilidade e experiência necessárias a esse tipo de missão. Mas era homem de confiança de Zé Pereira, e conhecido por sua valentia.

          De Princesa à Custódia, a distância em linha reta, é de 60 quilómetros. O deslocamento da Volante foi feito a pé. Era uma estrada precária, em terreno arenoso, de muitas ladeiras, e de elevada temperatura naquela época do ano, o que retardou a marcha da Volante.  Caminhando-se 8 horas por dia, percorre-se, aproximadamente, 30 Quilômetros.  Mas a caminhada, iniciada no dia 1 de fevereiro, foi estafante e durou três dias.

     Na tarde do dia 3 de fevereiro, quando o Tenente Francisco Oliveira chegou com a sua tropa em Custódia, lá encontrou outra Volante da Paraíba, vinda de Monteiro, com a mesma missão, composta por 20 homens, sob Comando do Tenente Comissionado Joaquim Adalto. O Oficial Comissionado era uma situação passageira, espécie de estágio preparatório, para efetivação no Posto.  Essa tropa já estava na região há alguns dias.  Esse encontro das Patrulhas deu novo ânimo à tropa. As duas Volantes passaram então se ser comandadas pelo Tenente Francisco Oliveira.

     Depois de colher informações dos muitos crimes cometidos pelo Grupo de Lampião naquela cidade e localidades vizinhas, e do possível rumo que ele tomou, a tropa Paraibana saiu no seu encalço, na manhã seguinte, dia 4 de fevereiro.   

     O destino inicial foi a localidade de Algodões, a 60 quilômetros de distância, em estradas também precária. Foram  mais três dias de estafante marcha. Nesse percurso, nas proximidades de Carnaúba das Flores, à 20 quilômetros da fronteira com Alagoas, a Tropa Paraibana se encontrou com a Volante de Pernambuco, sob o Comando do Tenente Graciliano Salgado, composta por 40 Soldados.

     Quando o Tenente Graciliano Salgado tomou conhecimento da missão dos paraibanos, não se mostrou interessado em lhes prestar ajuda. Mas o Tenente Oliveira, de forma resoluta, comunicou ao Tenente Graciliano, que continuaria no cumprimente da missão, mesmo sem a participação dos Pernambucanos.

    Sentindo-se desafiado, o Tenente Graciliano, mesmo sem entusiasmo, resolveu se integrar à Tropa, porém, marchando na retaguarda. A marcha teve continuidade, agora com um efetivo de 80 homens.

     Quilômetros depois de caminhada, na localidade de Cacimba Velha, a Tropa Pernambucana foi emboscada por um vaqueiro que tinha sido vítima de atos violentos praticados pelos Comandando do Tenente Graciliano, o que acontecia com muita frequência. Não houve baixa na tropa.

   Daí pra frente, todas as pessoas que eram encontradas na estrada eram surradas pelos integrantes da tropa do Tenente Graciliano. Com essas atitudes, não concordava o Tenente Oliveira, que comunicou sua insatisfação ao Oficial Pernambucano, o que ensejou uma forte discussão entre eles.  Por essa razão a Volante Pernambucana se retirou da tropa.

      Meses depois o Tenente Graciliano Salgado foi assassinado em Arco Verde, por uma das suas vítimas.

    O Tenente Oliveira e seus Comandados seguiram a marcha. Pelos informações que a tropa ia colhendo ao longo do percurso, constatava-se que Lampião mudava muito de direção, o que dificultava localizá-lo.

   Mais adiante, na povoação Gameleira, ainda em Pernambuco, a Tropa Paraibana se encontrou com a um Volante daquele Estado, formada por 40 homens, sob o Comando do Tenente João Gomes, que, de imediato, se dispôs a participar da missão. A tropa voltava e ter 80 homens, o que, outra vez, levantou o ânimo dos paraibanos. A Volante Pernambucana seguiu na retaguarda da tropa.

     Por onde a tropa policial ia passando, tomava conhecimento das atrocidades que o grupo de facínora ia praticando. A ânsia de debelar aquele grupo foi se ampliando em cada integrante da tropa.

     Já estávamos no dia 21 de fevereiro, portando a tropa paraibana estava em uma estafante marcha há 21 dias. Além desse ingente esforço, considere-se no rol das dificuldades enfrentadas por esses policiais, a precariedade de alimentação, a higiene pessoal, a dormida e as questões relacionadas com a saúde.

    Mais à frente, os milicianos tomaram conhecimento de que Lampião, mais uma vez, mudou de rumo, seguindo em direção à  Mata Grande, Distrito de Paulo, em Alagoas.  Os policias foram na mesma direção e a distância entre eles e os bandidos estavam cada vez menor.

    Aproximadamente as doze horas daquele dia (21 de fevereiro), os policiais se aproximaram  de Mata Grande, quando perceberam que os bandidos tinham se desviado da estrada e ingressando em um matagal. Naquela condição era temerário a tropa fazer o mesmo, pois parecia uma armadilha. Cogitou-se a possibilidade dos bandidos estarem se ocultando no matagal para, à noite, atacar a cidade mais próxima, que era Mata Grande.

    Resolveram então seguir rapidamente para aquela localidade a fim de alertar a população e montar a sua defesa. Mas, ao ali chegar, perceberam que o ataque já havia ocorrido e os bandidos se retirado, seguindo na direção do sítio Serrote Preto, localizado naquelas proximidades

    Na mesma direção seguiu a Tropa Policial. Passava das cinco e meia, quando as Volantes chegaram às proximidades do Sítio Serrote Preto. Finalmente o combate iria ser iniciado.

  1. O combate

        O Sítio Serrote Preto ficava em uma parte elevada da região. Os cangaceiros estavam instalados em um casa de aspectos tosco, típica da região, localizada no centro de um amplo terreno.  Os bandidos ali estavam, descontraidamente espalhados em um grande pátio, portando suas armas, quando foram alertados por um sentinela do grupo que alarmou.

 - Macacos... Macacos ...

   Todos buscaram se abrigar e abriram fogo em direção ao caminho que dava acesso ao Sítio.

     O escritor Rodrigues de Carvalho, no seu livro” Serrote Preto”, uma primorosa obra, pela forma e pelo conteúdo, na qual buscamos grande parte dos dados aqui expostos, afirma que os Oficiais Paraibanos que Comandavam a Volante, eram Civis Comissionados, não tinham habilidades para aquela função e eram muito afoitos, agindo sob efeito da emoção.

     É daquele escritor, de forma reduzida, a seguinte descrição do combate;

        Ao ouvir os primeiros tiros, o Tenente Francisco Oliveira bradou.

     - Olha os bandidos ai. Avança rapaziada. Vamos coser esses miseráveis à faca.

     Sem o mínimo de cautela, e de maneira precipitada o afoite homem, partiu de punhal em riste para cima dos cangaceiros. Foi atingido com um tiro no rosto, indo a óbito de imediato. Quatro Soldados, de forma irracional, raivosa e temerária, acompanharam o Comandante, e também foram atingidos mortalmente.

     Os outros Soldados, fieis ao instinto de conservação, não acompanharam o Comandante e buscaram se abrigar.

      O Tenente Joaquim Adalto, acompanhado de um Soldado, também cometeram a mesma imprudência dos seus colegas. O Oficial foi gravemente ferido e o Soldado recebeu um disparo fatal.

    Nessas condições, o Sargento José Guedes, o praça mais antigo, assumiu o Comando das duas Volantes e a luta continuou. A troca de tiros foi intensa.

     A Volante Pernambucana, do Tenente João Gomes, que estava na retaguarda, a uma distância maior do que a que normalmente é aplicada nessas situações, ali permaneceu, abrindo fogo na direção dos bandidos.

     Mas, quatro Soldados dessa Patrulha, também de forma precipitada, e tomados de ódio dos cangaceiros, adentraram ao pátio do Sítio na ânsia de combater os bandidos. Nessas condições, foram facilmente assassinados.

   Uma tática comumente aplicada pelos cangaceiros em situações como essa, era buscar uma forma de atacar pela retaguarda. Foi isso que foi feito com por um grupo, sob o Comando de Levino, irmão de Lampião, que contornou a linha de tiros e atacou a tropa Policial pela retaguarda, entre as Volantes da Paraíba e a de Pernambuco.

     Nessas circunstâncias, a Tropa Paraibana ficou entre 3 linhas de tiro: a que vinha do pátio do Sítio, a do grupo do Cangaceiros Levino e a da tropa Pernambucana. Ao todo, 10 Soldados ficaram feridos, sendo 7 da Paraiba e 3 de Pernambuco.

    Anoiteceu e a falta de visibilidade fez o tiroteio se reduzir.

   Em meio a escuridão os cangaceiros, de candeeiro nas mãos, revistavam os muitos cadáveres prostrados no pátio do Sítio, recolhendo os seus pertences. 

     Com muita cautela a tropa foi batendo em retirada, conduzindo os feridos, e foram para Mata Grande, onde a população de mobilizou para prestar auxílio aos feridos.

     Na manhã seguinte, a Tropa voltou ao Serrote Preto, para resgatar os corpos dos combatentes que pereceram na luta, na expectativa de que os bandidos tinham se retirado, o que de fato ocorreu.

    No pátio do Sítio encontraram os corpos do Oficial e dos cinco Soldados Paraibanos, e dos quatro Soldados da Volante do Tenente João Gomes, todos em estado deplorável.

     No interior da casa estavam os corpos de três cangaceiros: Asa Branca, Corró e Guri.

    Foi um resultado trágico para as duas forças policiais envolvidas na luta.

  1. As providências do Governo

     O Tenente Adauto Oliveira e os 7 Soldados da Paraíba os 3 de Pernambuco, ficaram na casa do Chefe Político local, o Coronel Aquino Ribeiro,  sendo atendidos pelo poucos e amedrontados moradores.

    Os Comandos das Polícias de Pernambuco e de Alagoas enviaram reforços ao local. O Tenente Adauto se comunicou, por telegrama, com o Governador João Suassuna, solicitando recursos financeiros para manter a tropa.  

   O Dr. João Franca, Delegado de Polícias, viajou para Mata Grande, com os recursos solicitados. Poucos dias depois o Tenente Adalto faleceu. Todos os mortos da Volante Paraibana e os Cangaceiros, foram sepultados em Mata Grande.

    O Governo de Alagoas prestou o apoio possível naquelas circunstâncias.

     Os integrantes da Volante Paraibana estavam com a farda em estado deplorável. O Governo de Alagoas forneceu fardamento completo para todos.  Esse detalhe foi registrado na mensagem do Govenador à Assembleia, daquele ano.  

   Sargento José Guedes, Comandante da Volante que participou do Combate de Tenório, no qual perdeu a vida o Cangaceiro Livino Ferreira, irmão de Lampião.jpg No Comandante da Tropa, o Sargento Guedes negou-se a voltar à Paraíba de Navio ou de Trem, como foi oferecido pelo Governo de Alagoas. Os registros não especificam que meios de transporte foi utilizado para esse fim. Mas, a chegada de Tropa só foi registrada o dia 6 de março, portando 13 dias depois do combate.

 

    A Ordem do Dia, do Comando da PM, naquela data publica uma mensagem do Coronel Elísio Sobreira nos seguintes termos:

Ordem do Dia - O Combate do Serrote Preto

     Por decisão do Governador, o Tenente Severino Alves de Oliveira passou a integrar o Quadro efetivo da Corporação, uma vez que era Oficial Honorário, e sua viúva Etelvina Augusta de Oliveira, recebeu pensão com valor integral.

     O Tenente Adauto Oliveira era solteiro, e o seu filho Severino Adauto de Oliveira, recebeu uma pensão, também com valor integral. Esses atos foram formalizados através de um Decreto, o que era prática comum na época em se tratando de pensão.

   As viúvas dos Soldados também receberam pensão, em valor integral.

      Os Soldados feridos foram: Cipriano Melchides, Manuel Alves, Manuel Vicente de Andrade, Armando Caldeira, Paulino de Morais Neto, Augusto Lima e Luiz de Melo. Além desses, também ficaram feridos e foram intenados em um Hospital em Maceio os Soldados Paaibanos: Augusto Gomes de Lima e Manuel Vicente de Andrade

  Soldados mortos: Francisco Oliveira, Ezequiel Custódio, Guilherme de Melo, Artur Dantas e Tito Virgulino Gouveia.

    Esses fatos ocuparam muito espaço na imprensa Oficial e gerou uma verdadeira comoção.  Todos os Governadores do Nordeste, políticos de projeção nacional, autoridades do Poder Judiciário e lideranças municipais, empresários, e pessoas do povo, se solidarizaram com o Governador João Suassuna e com o Comandante da Polícia Militar.

    Nesse clima, o Deputado Estadual Herectino Zenayde iniciou uma subscrição para que voluntários pudessem contribuir com valores a serem destinados aos familiares das vítimas. A primeira contribuição foi do Dr. João Suassuna, no valor de um conto de reis. O nome e o valor de cada doação era publicado diariamente no Jornal A União. Em cerca de 30 dias foram arrecadados 50 contos e 600 mil reis. Esse valor foi doado aos familiares das vítimas. O valor que tocou às pensionistas dos Oficiais foi suficiente para cada uma delas comprar uma casa.

    Infelizmente, Lampião ainda viveu mais 13 anos.

Livro Combate do Serrote Preto

   A ilustração do Croqui da área do Combate do Serrote Preto, aqui exposto, foi publicado no Livro sobre a vida de Lampião, do escritor Frederico Pernambucano.

Veja também

Quatorze cangaceiros mortos em um confronto com a Polícia

 Cangaço depois da morte de Lampião

https://luzdefifo.blogspot.com/2012/07/as-batalhas-de-lampiao-serrote-preto.html

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Gilene
Gilene
2 meses atrás

Interessante o que acabei de ler aqui, existe muitos artigos em seu blog relacionado a este que acebei de ler gostei de seu blog. Cine vision filmes e series