A morte do Cangaceiro Meia-noite foi um grande golpe sofrido pelo grupo de Lampião, mesmo ele já tendo deixado de integrar aquela malta há poucos dias. Aqui vamos sintetizar o que alguns consagrados pesquisadores já publicaram sobre esse fato, a exemplo de João Costa, em um artigo no Jornal A União no dia 22 de janeiro de 2024.
Meia-Noite deixou o grupo de Lampião depois de um desentendimento com os irmãos Ferreira, após uma discussão que tiveram em um Sítio em São José de Piranhas, onde Lampião se recuperava de um ferimento no pé, o que lhe impediu de participar da invasão de Souza.
Esse fato ocorreu no dia 17 de agosto de 1924, quando o Grupo estava retornado do ataque de Souza e se deu por conta de Meia-noite acusar, perante o grupo, que os irmãos de Lampião, Levino e Antônio, tinham lhe roubado 9 contos, quando ele estava dormindo.
A discussão estava prestes a via de fatos, quando Lampião interviu, dando a Meia-noite o valor que ele alegava ter sido roubado, e mandou que ele deixasse o grupo, o que foi feito de imediato.
No dia 22 de agosto daquele ano, Meia-noite estava em busca de sossego quando chegou no Sítio Tataíra, Distrito de Teixeira, na casa de Zulmira, mulher com quem ele tinha se casado em uma Capela, em Patos do Irerê, Distrito de Teixeira.
Por meio de um pombeiro (Pessoas que agiam como informante) Zé Pereira tomou conhecimento dessa aparição de Meia-noite, nas suas terras, e mandou em seu encalço um grupo composto por 12 cabras e 4 Soldados, comandados pelo Subdelegado Manuel Virgulino. Do ponto de partida desse grupo ao local onde Meia-noite estava homiziado distava duas léguas.
O deslocamento dessa tropa começou no início da noite e no começo da madrugada ela chegou ao destino. No local existiam poucos casebres, de taipa, separados por centenas de metros, e que foram, com muita cautela, revistados.
Ao baterem na porta da última residência, a moradora se negou a abrir e, depois de muita insistência, o grupo percebeu que Meia-noite ali estava, o que foi comprovado pelos insultos que ele proferia contra a grupo de policiais.
A casa foi cercada e teve início um tiroteio. Meia-noite estava bem municiado, e, por estratégia de defesa, tinha feito vários buracos nas paredes da casa, por onde atirava, mudando constantemente de posição, dando a entender que eram vários atiradores. Ao tempo em que atirava, Meia-noite proferia impropérios contra os policiais, o que lhes causava irritação.
Transcorreu quase uma hora nessa peleja. Os tiros provocavam uma intensa cortina de fumaça, que a falta de vento ajudava a aumentar.
A essa altura, o Sargento Manuel Benício, Comandando uma Patrulha de 80 homens, que fazia parte do efetivo estacionado em Princesa, dentro do plano de Governo de guarnecer as divisas do Estado para evitar a invasão de grupos de Cangaceiros, voltava de mais uma missão e estava acantonado no lugar conhecido por Baixo.
Desse local, Manuel Benício ouviu o barulho dos tiros vindo dos lados de Tataíra, e deduziu que poderia ser mais um confronto da Polícia com Cangaceiros e que nesse caso, sua Patrulha poderia ser muito útil. Mesmo depois de uma longa caminhada com seus comandados, Manuel Benício suspendeu o acantonamento e iniciou o deslocamento na direção do tiroteio.
Pouco antes das cinco horas da manhã, o experiente Sargento e sua tropa chegaram ao local da luta. Ao se aproximar, Manuel Benício mandou o corneteiro tocar avançar, que era uma forma de comunicar à Patrulha que estava no local, que ali tinha chegada a Polícia. Meia-noite conhecia o toque e sentiu que seu fim estava chegando.
Após se informar da situação, a tropa tomou posição e abriu fogo contra o casebre. Meia-noite continuava resistindo com muitos tiros. E aja fumaça no ar.
Vendo-se quase perdido, Meia-noite pediu para que os policiais deixassem sua mulher sair, pois ela não tinha conta a acertar com a justiça. O pedido foi atendido e Zulmira saiu da casa e se retirou do local.
O tiroteio recomeçou e Meia-noite apelou para a única estratégia que conseguiu imaginar, e gritou, em tom desesperado.
- Preparem o fuzil, seus miseráveis, que eu vou sair, e lutar com vocês.
Manuel Benício comentou com seus homens, que o bandido deveria ter endoidado e ordenou que parassem de atirar. Ficaram todos de armas apontadas para a porta do casebre.
Fez-se um profundo silêncio. O tempo foi se passando. O silêncio continuava. Acharam que Meia-noite tinha morrido.
A Tropa resolveu entrar na casa. Entraram. Nada encontraram. Meia-noite tinham desaparecido. No chão constataram marcas de sengue e contaram cerca de 400 cápsulas de cartuchos de fuzil.
Na verdade, a fumaceira causada pelos tiros facilitou a fuga de Meia-noite por uma saída lateral da casa.
Passava das cinco e meia quando Meia-noite, antes de a Polícia entrar no casebre de Zulmira, chegou ao terceiro casebre da vizinhança, onde os moradores estavam apavorados. Pediu água e tomou de forma apressada. Depois jogou água no cano do Fuzil. Entregou ao dono da casa a quantia de 9 contos de reis, e pediu que ele entregasse a Zulmira, que na fuga, tinha seguido em outra direção.
Nessa conversa com o vizinho, Meia-noite disse que estava com um ferimento leve na perna, mas tinha quebrado o braço direito, quando pulou uma cerca para chagar àquele local. Dessa forma ele ficou sem condições de fazer uso da mão direita
Em seguida, Meia-noite entrou no mato e caminhou cerca de duas horas, até chegar na casa de um velho agricultor a quem pediu ajuda, e foi acolhido, sendo acomodado em um dos quartos da casa. Em seguida o idoso campônio, alegando que iria procurar ajuda, se dirigiu à Princesa, onde narrou o fato ao Subdelegado Manuel Lopes Diniz, que, acompanhado de 4 Soldados, foi ao local, guiado pelo idoso agricultor.
O Grupo de Policiais entrou na casa em silêncio. Ao perceber o tipo de ajuda que lhe estava sendo oferecida, Meia-noite sacou de uma Parabélum e abriu fogo contra os Policiais, que, instintivamente se abrigaram. Sem poder recarregar a arma só com uma mão, Meia-noite, como única saída para continuar vivo, fugiu sem ser viso pelos seus perseguidores.
Um Soldado da Patrulha viu Meia-noite fugindo e fez um disparo que atingiu a perna dele, mais, mas não conteve a fuga.
Caminhando com dificuldades, Meia-noite procurou socorro no Saco dos Caçulas, área rural de Teixeira, onde tinha feito amizades, anos antes, quando ali esteve com Lampião. Nesse sítio, ele foi acolhido, em sigilo, por Manoel Lopes, conhecido por Ronco Grosso, um protegido de Zé Pereira, que já tinha sido cangaceiro. Quando Meia-noite estava se recuperando, na casa de Ronco Grosso, começou a reaparecer Volantes na área e por essa razão ele foi levado para um esconderijo.
Temendo que essa acolhida de Meia-noite não fosse do agrado de Zé Pereira, Ronco Grosso e um comparsa conhecido por Tocha, foram ao esconderijo e executaram Meia Noite.
Com a morte do cangaceiro Meia-noite, terminava a história de dos mais valentes cangaceiros grupo de Lampião.
Cangaço depois da morte de Lampião