Polícia pra fazer medo foi um episódio ocorrido durante um plantão noturno de uma das equipes que prestava serviço no Centro de Operações Policiais Militares, instalado no Quartel do Comando Geral da PM/PB. Esse fato foi muito comentado entre as demais equipes que integravam esse serviço, sempre em forma de gozação e dele tomei conhecimento dias depois, durante um plantão no mesmo local. Vejamos como foi.
Em 1987 foi criado o Serviço de Coordenador do COPOM, que era executado por Capitães. Naquele local atuavam três telefonistas que recebiam as solicitações de chamadas e passavam para os três Operadores, que eram experientes Sargentos, para que movimentassem as Guarnições na rua para atender aos chamados.
Mesmo sem participar diretamente das ações de rua, essa era uma atividade muito estressante para a equipe do COPOM. Quando havia uma ocorrência de assalto a banco, real ou provocada por alarme falso, esse pessoal vivenciava o mesmo clima de tensão que era sentido pelo pessoal que estava atuando na rua.
O Capitão só intervinha para orientar as Guarnições nos casos de ocorrências de maior gravidade.
Um tipo de ocorrência muito comum, depois das dez da noite, era a chamada averiguação de suspeito. Os solicitantes narravam que tinha uma pessoa no quintal, ou estranhos estavam circulando na rua, ou coisas dessa natureza. As Guarnições eram acionadas, mas, quase sempre nada era constatado.
Trabalhei como Coordenador do COPOM por quase dois anos em jornadas de doze horas, sempre à noite. Em média era um serviço por semana. Mesmo nesse clima tenso, imposto pela natureza do serviço, eu tinha um bom relacionamento com a equipe, de quem eu estava sempre ouvindo casos curiosos.
Certa noite, ouvi de um Sargento, a narração do caso que passo a expor:
Havia ocorrido dois chamados para ocorrências de assalto a banco durante a tarde. Os nervos da equipe estavam à flor da pele. No começo da noite, o Soldado Soares atendeu a uma ligação em que a solicitante parecia muito nervosa. A mulher falava sem parar e dizia coisas sem nexo. O paciente Soldado ficou tentando entender o que ela pretendia, mas a sua interlocutora não parava de falar. Em tom debochado e autoritário, ela fazia uso de palavras injuriosas à Polícia Militar. A conversa foi se prolongando e o Policial, sem chance de ser ouvido, foi perdendo a paciência.
Soares respirou fundo e tentando obter uma ajuda, olhou para os seus companheiros em volta e viu que todos estavam ocupados. Baixou a cabeça, tirou o telefone do ouvido e colocou sobre a mesa. E a mulher continuou falando sem parar. Sempre em tom agressivo.
Nesse infindo monólogo, sempre com frases longas e desconexas, Soares ouviu algo como “ele vem assinar um documento do débito”
De repente se fez um silêncio e Soares constatou que ela tinha desligado. Outros chamados se sucederam e aquele policial foi atendendo. Cerca de uma hora depois ocorreu novo chamado e ele percebeu que era a mesma pessoa.
Controlando o seu estado de ânimo, Soares perguntou:
- A Senhora de novo? Afinal, como é o seu nome e o que a Senhora deseja da Polícia?
Ela, já em tom bem ameno, que parecia ser outra pessoa, respondeu:
- Meu nome é Graça. Moro aqui perto da Praça Bela Vista e estou esperando um senhor que vem aqui na minha casa para assinar um documento sobre um débito que eu tenho com ele. E quero que um carro da Polícia fique ali na esquina. Mas não é para fazer nada não. É só pra fazer medo a ele.
Soares, ainda abalado pelo esculacho que tinha levado ainda a pouco, respondeu sem pensar muito:
- Dona Graça, a Senhora ligou errado. Aqui é a Polícia Militar. Não podemos mandar polícia para fazer medo a alguém. Se é isso que a Senhora quer, ligue para o Papangu.
Graça, deu uma longa risada, pediu desculpas por tudo o que tinha dito e conversou um pouco mais com o jovem Soldado, só que agora de forma civilizada. Ainda rindo, a solicitante disse que não precisava mais do serviço, deu boa noite e desligou.
De imediato, Soares relatou esse fato ao Coordenador que determinou que uma Guarnição fizesse rondas no local. Nada foi constatado.
Durante o tempo em que trabalhou no COPOM, Soares ficou conhecido como o telefonista do Papangu.